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AGO 21
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Fim do ciclo de alta da Selic? Tudo depende da manutenção do teto de gastos e da política fiscal — e as próximas semanas devem ser decisivas

Para Marcelo Fonseca, chama a atenção o posicionamento do Copom de elevar a taxa até um patamar restritivo, mas o BC está no caminho certo. O economista vê o fim do ciclo de alta no patamar dos 7,5%, mas tudo depende do destino do teto de gastos

Jasmine Olga

Assim como para boa parte do mercado financeiro, a decisão do Banco Central em elevar a taxa Selic de 4,25% para 5,25% ao ano não foi uma surpresa para Marcelo Fonseca, economista-chefe do Opportunity Total.

Com a inflação mostrando cada vez mais sinais de que é influenciada por muito mais que apenas fatores temporários, Fonseca já trabalhava com a ideia de uma Selic de, no mínimo, 7,5% ao fim do ciclo de alta e uma inflação em cerca de 4% em 2022. Mas isso depende.

Embora o Banco Central tenha sinalizado que está disposto a encarar os efeitos negativos na atividade econômica em nome da ancoragem das expectativas de inflação para 2022 e 2023, os riscos fiscais podem acelerar o processo de elevação dos preços e obrigar o BC a entregar um ciclo de juros mais alto.

No momento, são diversas as preocupações do mercado financeiro com relação às contas públicas. A ameaça de um calote no pagamento de precatórios está no ar e a equipe econômica busca maneiras de fazer a reformulação do Bolsa Família caber dentro do teto de gastos.

“Qualquer indicação ou movimento no sentido de enfraquecer ou flexibilizar o teto teria como consequência a mudança de percepção dos agentes econômicos. No fundo, o BC está sinalizando com a comunicação que as decisões são dependentes dos desdobramentos da política fiscal que a gente vai assistir nas próximas semanas”, aponta o economista.

Em entrevista concedida logo após a divulgação da decisão, Marcelo Fonseca afirmou acreditar que o banco central está no caminho certo para controlar a inflação e também sobre os desdobramentos esperados. Veja os principais pontos da conversa do economista com o Seu Dinheiro:

Vocês projetavam uma alta de 1 ponto percentual na Selic e, de fato, o Banco Central seguiu esse caminho. Você não deve estar surpreso com o movimento, mas quais pontos do comunicado chamaram a sua atenção?

Sem dúvida o principal ponto foi o reconhecimento de que a taxa de juros pode encerrar o ciclo de alta em território restritivo. Ou seja, contracionista. Isso significa que ao contrário do que eles vinham indicando até então — com o ciclo de alta indo até a taxa neutra —, agora essa sinalização é de que a Selic pode ir para um território onde tenha um impacto negativo sobre a atividade econômica e  promover alguma desaceleração sobre a economia.

Você concorda com essa posição?

É uma posição correta, que reflete um cenário amplamente conhecido e muito desafiador: a alta da inflação está se enraizando no sistema de preços. No momento, a inflação não decorre apenas dos choques que a alta internacional das commodities e a depreciação cambial trouxeram. E isso é preocupante, pois torna choques e eventos de natureza temporária em um processo mais permanente. A gente já identifica no processo inflacionário elementos que vão além disso, englobam repasses não só na cadeia de bens mas também para os serviços.

E temos também o balanço de riscos. Nosso cenário fiscal é complexo e representa um risco substancial para a futura alta da inflação. Temos um problema ocasionado pelo repasse dos choques iniciais, mas também temos riscos oriundos das incertezas fiscais, que podem acelerar o processo de alta da inflação. Com essa indicação mais dura, ele está combatendo tanto as pressões quanto o risco fiscal que se apresenta permanentemente no horizonte.

Já é possível observar que o mercado começa a trabalhar com uma desancoragem das expectativas de inflação para 2022. Com a decisão de hoje, o BC consegue ancorar novamente essas expectativas?

A inflação também decorre das expectativas e há medida que temos um cenário de inflação desafiador e riscos fiscais, você começa a ter contaminação dessas expectativas, Essa ação mais dura tem objetivo de impedir que  essas pressões se propaguem e mostram a intenção de  garantir a convergência da inflação para 2022.

A política monetária opera com defasagem e leva tempo para surtir os efeitos desejados. Assim, a meta de inflação já não é 2021, pois não é um alvo possível. O BC não tem mais controle da inflação de 2021,em grande medida, mas ele tem quando o horizonte da política monetária é 2022 e 2023.

Após a alta de hoje, qual a projeção de vocês para a Selic? O ciclo de altas deve terminar em qual patamar?

Acreditamos que o ciclo termine na faixa de 7,5% a 8% ao ano. Conforme sinalizado no comunicado de hoje, a próxima reunião deve elevar a Selic para 6,25% (alta de um ponto percentual) em setembro. Imagino que o Copom desacelere para uma alta de 0,75 ponto percentual em outubro e eleve a taxa a 7,5% em dezembro. A dúvida é se existirá uma alta residual em janeiro para 8% ou não.

O balanço de riscos é muito importante no processo de decisão do banco central e ele dá grande peso ao risco fiscal. No fundo, o BC está sinalizando com a comunicação que as decisões são dependentes dos desdobramentos da política fiscal que a gente vai assistir nas próximas semanas:o encaminhamento da questão dos precatórios, a definição do novo Bolsa Família e como isso se encaixa  no orçamento de 2022. Respeitar o teto de gastos é fundamental para essa ideia de Selic que a gente tá discutindo.

Qualquer indicação ou movimento no sentido de enfraquecer ou flexibilizar o teto teria como consequência a mudança de percepção dos agentes econômicos, levando o BC a entregar um ciclo de juros mais alto.

Vimos nas últimas semanas que a elevação de 1 ponto percentual já era dada como certa por grande parte dos agentes financeiros. O que esperar da reação dos mercados amanhã?

Acompanhamos em grande medida a antecipação dessa movimentação do Banco Central e o tom mais duro. Não foi uma grande surpresa. O mercado deve reagir de forma moderada, até mesmo na pesquisa semanal do Focus e outras realizadas pelas corretoras e grandes instituições financeiras.


Reprodução da matéria publicada no “Seu Dinheiro”, 04/08/2021.